Por repetidas vezes, várias pessoas testemunharam aquela Figura Maldita e sinônimo da escória de uma esfera falida perambulando dentre os intestinos do Edifício Maletta. Isto, na visão menos sensível de crápulas sanguessugas que parasitam em cima de sofismas crendices. Todos, societários padrões, vivendo sadicamente corrosivos em um estágio gregário! Não conseguiram, em momento algum, extrair e absorver as coisas bonitas do dito “feio”. Julgavam, por frestas sociais, a fraqueza que o envolvia em relação ao que o vício do álcool provocava em seu Ser, metamorfoseando-o em uma presença desagradável e, às vezes, agressiva.
Quem o via, à distância, pensava que Ele habitava apenas “a ruína” de uma jovem cidade. Mas quem o conheceu, quem leu seus textos, sabe que a ruína foi sempre renovada em mordacidade, em ferocidade, em sagacidade.
Se é mito!?! Não se sabe! Mas as línguas “quimerianas” contam que Paulo Sérgio Leão de Oliveira e Castro – o último dos beatniks – transcrevia poemas, mantidos trancafiados em seu intelecto, para sujos guardanapos de papel. E nos botecos 24H, de mesa em mesa, transformava-os em moeda imaginária. Num tipo de “escambo-escravo”, os trocava por doses e doses de qualquer cachaça vagabunda que o alimentava de fantasias criativas, para poder suportar este mundinho medíocre, que nos é imposto por falsários demagogos da nova ordem.
Este ser pensante e incompreendido, que se fundia com a arquitetura do Maletta, habitava o lado sujo e marginal de um templo discriminador. Ali naquele abandono, florava um PUTO escritor, com uma bagagem única e tão preciosa de perfeita simetria periférica, escondida no lado B do Leão.
Alguns tiveram a oportunidade, a experiência, o prazer e o desprazer de conhecê-lo. Será que se tornou poeta por acaso? Ou por “dom”? E mendigo por opção?
Reza a lenda que este carioca, nascido em 19 de novembro de 1943, fez de sua vida sua melhor poesia. Presenciou o Festival de Woodstock, conheceu Janis Joplin (um dos ícones de uma geração que transformou e modificou a cultura com todo o modo rebelde e idealista de pensar, dos anos 70) na cidade do Rio de Janeiro; foi artesão, redator-publicitário e morador de rua até o fim de sua vida - despercebida pelos transeuntes locais. Além de ter sido um exímio conhecedor de jazz e rock and roll.
Seus poemas desfilaram nas seguintes publicações coletivas de textos literários em diferentes formatos gráficos (livros, revistas, jornais, suplementos, fanzines, cartelas, dobraduras, folhetos, etc.): envelope “Razão de Dois”, jornal mural “Bacana”, zine “Naú Frágil”, 8ª Arte e também em “Clé” e “Não”. Nomes caracterizados como veículos culturais, elaborados por grupos editoriais da cidade de Belo Horizonte.
Em 1997 estava com um projeto de um livro, cujo nome seria “LIVRO”. Infelizmente não chegou a ser concretizado, mas neste mesmo ano de 97 lançou, em novembro, um livreto de pequeno formato para bolso, intitulado “A Ordem do Acaso”, obra rara e fora de catálogo. Esta versão pequena é uma coletânea de algumas de suas poesias e foi publicada pela coleção “Poesia Orbital”, da Associação Cultural Pandora, que englobava mais 61 poetas, cada qual com suas respectivas obras e uma tiragem de 500 exemplares para cada autor/livro.
Esta figura histórica que circulava com desenvoltura pelos bares da capital mineira e mais precisamente pelo antológico Maletta, também foi tema de um curta-metragem/documentário, roteirizado e dirigido por Túlio Travaglia, exibido na Sala Humberto Mauro do Palácio das Artes, em 15 de maio de 2001 e em encontros isolados do circuito underground.
Um dos momentos mais marcantes desta lenda, foi quando, convidaram-no para participar da Bienal Internacional de Poesia, realizada no Espaço Unibanco Belas Artes, em Belo Horizonte. Recitou (resmungou embriagado), sua poesia “A Noite dos Donos”:
“(...) eu quero que os urubus piquem meu pênis passivo...”
Enquanto apresentava sua performance poética retirando seu pênis e batendo-o sobre a mesa, a platéia (mais conservadora) ficou estática, petrificada. E logo após o término da apresentação, esvaiu-se retrucando ultrajes incompreensíveis.
Um poeta veterano que entrou e saiu de todas as estruturas sociais, culturais, boêmias, etílicas e, principalmente, existenciais, isso no sentido mais sartreano que essa expressão possa ter.
“Prefiro a cachaça sem IRA, do que o uísque com sangue”. (vestígios de uma epígrafe de vida leoniana).
O Poeta nos deixou saudades em 07 de setembro de 2002.
No ano de 2003, aconteceu o 1º Encontro Cultural em Movimento de Belo Horizonte, nos dias 13 e 14 de setembro (sábado e domingo). O evento foi dedicado a Paulo Leão & Raul Seixas, realizado com perspicácia por pessoas envolvidas na música e na literatura alternativa, a fim de buscar a divulgação artística da região metropolitana de BH e uma preservação da memória cultural de nosso povo.
MATERIAL PESQUISADO:
Orelha e informações complementares do livro: A Ordem do Acaso, nov./1997.
UAI Poético, pesquisando as raízes e veias poéticas, 2001.
Almanaque UAI!, nº: 01 – Ano 01, out./2003.
Zine Oitava Arte, nº: 01 – nov./2003.
Curta-metragem: “Paulo Leão, um poeta beat" (BRA, 2000, Túlio Travaglia).
5 comentários:
Me sinto na obrigação de parabenizar o mutuante Luciano Nunes pelo texto magnífico sobre Paulo Leão e pelo belo trabalho de pesquisa!
Parabéns, meu amigo! Este é o verdadeiro espírito mutuante que nos habita... Um prazer trabalhar contigo.
Grande abraço,
Sylvia.
Valeu Sylvia! Mas Nada seria possível se os Responsáveis pela fonte de pesquisa não tivessem dado o ponta-pé inicial. É isso.
Leão-saudades de momentos únicos, lúdicos que passamos nas noites de bh...escreveste a orelha de um livro meu: com olhos,tato,paladar de uma germana,vendo o eterno do seu trabalho...
Cresci escutando ele balbuciando suas poesia e críticas a tudo e todos, saudades.
Poeta belo-horizontino paulo leao. Um dos melhores de sua época. a Geraçao beat.
Danka abeat: Músico,escritor e desenhistas autodidata. MONTES CLAROS-MG.
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